quarta-feira, 11 de março de 2009

198 mães adolescentes em dois anos


«Segundo Regina Sampaio, assistente social no CHF, houve em 2008, comparativamente em relação a 2007, uma melhoria

Em dois anos 198 foram mães adolescentes


O Hospital Central do Funchal (HCF), através do seu Serviço Social, tem prestado acompanhamento a muitas jovens que tomam conhecimento da sua gravidez. Só em 2007 passaram por aquele serviço e acabaram por ser mães 113 adolescentes, duas delas com 13 anos e três com 14. No ano passado, os números foram ligeiramente mais baixos mas ainda assim preocupantes: 85 raparigas com idades compreendidas entre os 15 e os 19 anos foram mães. Segundo Regina Sampaio, assistente social do HCF, houve no último ano uma melhoria da situação já que, não foram contabilizadas adolescentes tão novas. Neste momento, o maior número de mães adolescentes ronda a faixa etária dos 16-17 anos e desde que começou o ano (até ao final de Fevereiro) já deram entrada naquele serviço 20 processos de mães adolescentes.
Para Belita Mendonça, directora do Serviço Social do HCF, uma das razões que estão na orgem desta problemática é o facto da Educação Sexual ainda não estar a ser feita da melhor maneira. Apesar de os jovens estarem bem informados e de saberem que é necessário usar métodos contraceptivos, eles arriscam, «é proprio da idade», refere. Depois, adianta ainda, «o problema está a forma de pensar da nossa sociedade. São poucos os pais que se sentem à vontade de falar sobre sexualidade com os filhos».

«Uma criança a cuidar de outra criança»

O protocolo que existe entre o Serviço de Obstetrícia e o Serviço Social, baseia-se sobretudo no sentido de minimizar os riscos para a criança recém-nascida. Segundo Regina Sampaio, «desde 2005 que nós fazemos esta tentativa porque constatámos que as jovens saíam daqui sem apoios e desenquadradas e era complicado sobretudo para os recém-nascidos. Muitas vezes isso reflectia-se em internamentos logo a seguir ao parto e era muito complicado». É por isso que o atendimento feito no hospital consiste essencialmente numa avaliação nas vertentes social, familiar e psicológica porque em causa está uma adolescente com muita imaturidade e na maioria das vezes sem o suporte da família que é muito importante nestas situações.
Como passou a explicar a assistente social, «quando falamos de adolescentes de 13, 14 anos, temos de responsabilizar um familiar adulto no sentido de podermos incutir-lhe alguma responsabilidade. Uma jovem com 13, ou 15 anos, tem muita dificuldade em assumir na íntegra as suas responsabilidades maternas. Aliás, estamos a falar de uma criança a cuidar de outra criança. Sabemos como é difícil a adolescente começar a lidar com o bebé, a controlar os sonos, a tratar da alimentação, entre outros aspectos»,esclarece a assistente social.
Quando a jovem não tem poder económico e os pais não têm facilidade em contribuir na alimentação da criança, ou então são raparigas que já têm um processo na comissão de Protecção de Crianças e Jovens e até no próprio Tribunal de Menores, os serviços do hospital encaminham as jovens mães para instituições onde possam receber todo o apoio possível.

Quando elas não querem ser mães tão cedo

Quando uma jovem recebe a notícia de que será mãe a primeira reacção é de revolta. Não quer acreditar que aquilo está a acontecer com ela e o mundo parece ter-lhe desabado na cabeça. Depois do choque, e quando sentem os primeiros movimentos fetais e vêem o seu corpo a transformar-se é que ganham consciência do seu estado. Há jovens que se recusam ter a criança, outras decidem dar para adopção. Regina Sampaio conta que no ano passado houve um único caso desta natureza. «Assim que soube que estava grávida, a jovem decidiu que iria entregar a criança, assim que esta nascesse, para adopção. É muito raro isto acontecer. Aliás, este caso foi partilhado pela família e foi um processo encaminhado».
Quando não querem mesmo ter a criança e se ainda não tiverem completado as dez semanas de gestação, as jovens vão a uma consulta específica por forma a serem esclarecidas porque vão com sentimentos de muita culpa. Este trabalho, explica a asistente social, é feito no sentido de evitar sequelas a nível psíquico.

Atendimento ao jovem tem cerca de 3 mil inscritos

Criado em Outubro de 1998, pela médica Maria das Neves, o Serviço de Atendimento ao Jovem (SAJ), no Centro de Saúde do Bom Jesus, para rapazes e raparigas dos 13 aos 21 anos, tem actualmente cerca de três mil jovens inscritos. A maioria procura o serviço para tirar dúvidas sobre planeamento familiar mas também há quem o procure para falar de problemas relacionados com a acne, anorexia/bulimia, problemas familiares, desmotivação escolar e suspeita de gravidez.
De acordo com a enfermeira especialista em saúde materna e obstetrícia, Cristina Freitas, as adolescentes que procuram o serviço com suspeita de gravidez estão realmente grávidas sendo que é aqui que entra um dos papéis mais importantes do SAJ: o apoio e encaminhamento das jovens caso tenham idade inferior a 17 anos. Como passou a explicar a enfermeira que não só acompanha a gravidez como também a fase do pós-parto, se as raparigas tiverem menos de 17 anos são logo reencaminhadas para a consulta externa do serviço de Obstetrícia de Grávidas de Risco do Hospital Central do Funchal. Se forem mais velhas, todas as consultas e exames serão feitos no Centro de Saúde do Bom Jesus até mesmo depois de o bebé nascer.
Por forma a promover um apoio ainda maior nesta área, este serviço desenvolve também com as adolescentes um projecto chamado “Rei na Barriga”, um programa que tem como principal objectivo ajudar a adolescente grávida nas áreas que necessita, nomeadamente na oferta de consultas médicas, enfermagem, psicologia, nutrição e serviço social.
Outra novidade, segundo referiu Cristina Freitas, está na realização de um questionário que está a ser feito a todos os jovens que recorrem ao SAJ para permitir aos profissionais da saúde obter informações relativas aos problemas dos adolescentes. Este questionário está dividido em três áreas, nomeadamente, as Doenças Sexualmente Transmissíveis, perturbações alimentares e gravidez na adolescência.
De referir que existe ainda a linha SOS Adolescente (800 204 125) que ajuda a esclarecer dúvidas sobre diversas temáticas com a adolescência.

Centro da Mãe acolhe 480 utentes

O Centro da Mãe é uma das instituições de solidariedade social que mais tem contribuído para o apoio das jovens mães. Até ao momento encontram-se inscritas 480 utentes, sendo que 147 delas inscreveram-se em 2007 havendo, por isso, um aumento significativo de mães em risco na Região se for tomado em conta o facto de as utentes terem começado a ser atendidas apenas em 2001. Sedeado na Avenida Luís de Camões, no Funchal, este centro funciona com uma equipa multidisciplinar composta por uma assistente administrativa e uma assistente social. Sempre que há possibilidade, o apoio e acompanhamento às mães é feito no seu âmbito familiar ou local de habitação. Nos casos mais graves, em que há isolamento e problemas a nível familiares, o centro presta os cuidados profissionais necessários, oferecendo também formação profissional que permita às mães a possibilidade de um futuro independente e seguro. Segundo Rita Vasconcelos, elemento da direcção do Centro da Mãe, iniciou-se em Outubro de 2008 o curso de Assistente Familiar e Apoio à Comunidade, de nível II com equivalência ao 9º ano, na Escola da Apel, que terá a duração de dois anos. Já no final de 2007 teve início um curso de manicura. De salientar que, a avaliação das necessidades e da capacidade de resposta do centro, há igualmente, um apoio ao nível de papas, leite e fraldas, constituindo estes últimos a maioria dos pedidos.
Esta instituição tem como objectivos principais a realização pessoal e integração sócio-familiar das grávidas e jovens mães em risco e garantir o direito à vida, bem-estar e educação dos seus filhos.
Todas as mães que chegam a este centro, quer sejam encaminhadas por uma assistente social ou outros técnicos, são atendidas pela assistente social e pela psicóloga para avaliação da sua situação. Todos os casos são atendidos individualmente, variando os apoios prestados consoante a avaliação das necessidades e a nossa capacidade de resposta existindo, igualmente, um apoio ao nível de papas, leite e fraldas, constituindo estes últimos a maioria dos pedidos.
Desde 2001 até ao momento, encontram-se inscritas 480 utentes, sendo que 147 delas se inscreveram em 2007 verificando-se, assim, um aumento significativo de mães em risco na Região.

Perfil dos adolescentes que se tornam pais

Embora seja errada a ideia de que as gravidezes nas adolescentes acontecem apenas nos estratos sociais mais baixos – de um modo geral, as raparigas que engravidam muito cedo apresentam sobretudo situações de carência afectiva. Não gostam de estudar, têm pouca auto-estima, provêm de famílias numerosas e sofreram uma perda que lhes causou muito transtorno, como por exemplo, a falta da mãe ou do pai. Por vezes, também a relação de incompreensão com os pais é mascarada pela concessão de excessiva liberdade que a adolescente pode entender como sendo um abandono.
Os pais, são na sua maioria rapazes mais velhos que abandonaram muito cedo os estudos e alguns até se encontram desempregados por não terem hábitos de trabalho. Existem ainda casos de jovens toxicodependentes e que não querem assumir qualquer tipo de responsabilidade em relação à gravidez. Desconfiam até se são mesmo pais do bebé e recusam-se a dar-lhe o nome.
As jovens, embora estudantes acabam por se ver obrigadas a deixar os estudos para irem trabalhar e algumas são obrigadas a casar. Esta última condição é muitas vezes imposta pela família para responsabilizar o casal.


Lucia Mendonça da Silva»

Fonte:Jornal da Madeira
Link:http://www.jornaldamadeira.pt/not2008.php?Seccao=17&id=118148&sdata=2009-03-08

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